sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

EU VIVO SÓ TERNURAS


Francisco Miguel de Moura*





Li, nestes dias, ‘Eu vivo só ternuras’, uma obra realmente importante para o sentimento e a emoção de todos os que têm ou tiveram netos, e também para todos os que não tem nem tiveram um netinho. Ou seja, um livro cuja referência é a família. E, sem família, o homem é incompleto, além das completudes espirituais. E ainda existe gente que menospreza a família. Não sabe o que é ternura. Mas o livro não é ótimo apenas pelo assunto, também o é pela forma como desenvolve a história. Não é bem história (nem estória), é assunto mesmo, a convivência, o dia-a-dia de ver, ouvir, sentir e empatizar com a criança em corpo e espírito, em amor e amizade. Olhem só que belo trecho! Escolhi, entre muitos, este do começo do 2º capítulo:

“De mãos dadas, o meu neto e eu caminhávamos pela calçada, em volta da Praça da Matriz. Era meia-tarde.

De repente, o meu neto estendeu a mãozinha livre e apontou o céu:

– Olha, vovô, olha! O sol apagou!”

Em quatro linhas dá pra perceber a prosa de Nelson Hoffmann, um romancista de mão-cheia, realista, consciente, profundo. E é possível sentir a grandeza e a beleza do diálogo com seu neto: inocência de criança e ventura do avô. Livro que merece ser editado por grandes editoras e distribuído por todo o Brasil, inclusive nas escolas para tornar-se leitura paradidática. Em carta, o escritor Nelson Hoffmann me diz, respondendo a um e-mail de minha parte: “Observei que você tem uma neta de cinco anos. Vi em seu blogue, que também já perambulou pelos anos de nossa quase distante infância. Assim, lembrei-me de lhe mandar este meu ‘Eu vivo só ternuras’. Foi escrito para meu neto Ariel, quando ele fez cinco anos. O livro foi para a Europa, onde não para de fazer sucesso. Na Itália, então, continua sendo reeditado a todo ano. Nunca pensei que o assunto pudesse provocar tamanha paixão. Ou o modo como o assunto foi abordado.”.

Há muitos enfoques para o escritor enfrentar a infância: em crônica do viver e repensar a própria infância, contá-la como um romance, ou então colocar como Hoffmann fez: a vivência do neto de cinco anos com seu avô, nos seus grandes momentos de ternura, com a franqueza que a criança tem para com os adultos, ou seja, tornar-se o avô uma também criança. Foi esta materialização em letra e doçura que me impressionou. Li o livro de uma “deitada” só. Pois, hoje, pouco leio sentado: enfio-me numa rede e não durmo. Li sem anotar nada. E essa relação de avô com neto, enquanto não se torna besta, ou seja, o menino não queira pensar como o adulto, é imperdível, na vida e na literatura. Quem não tem a sabedoria de entender a criança, é porque lhe falta a luz do amor, a luz do bom discurso e não pode ser intérprete da linguagem da criança e do seu mundo, interação geradora de encanto e ternura. Se eu escrevesse sobre crianças e/ou para crianças, gostaria de fazer como ele, nesse pequeno grande livro. Nada mais.

Ah, mas precisamos esclarecer que Nelson Hoffmann é um correspondente maravilhoso e prova que é amigo do Piauí através de cartas a seus amigos, entre os quais me incluo, e artigos e crônicas, estas sempre inseridas nos seus livros. É também um grande romancista que mora em Roque Gonzáles - RS, e, certamente, um homem feliz. E muito mais feliz é seu neto, por ter um “vô” tão bom homem e tão forte escritor.

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*Francisco Miguel de Moura, escritor, membro da Academia Piauiense de Letras (APL) e da Associação Internacional de Escritores e Artistas (IWA - Sigla em inglês), com sede em Toledo, OH, Estados Unidos.

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