sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

LITERATURA BRASILEIRA - EDSON GUEDES DE MORAIS


escritores chico miguel, jaci bezerra e edson guedes de morais, em recife-pe


CALENDÁRIO DOS 8O ANOS

Poemas de janeiro


I - TRILHA


N
este exercício de ser,
dura gestação de mim,
quanto tempo inutilmente!

A solidão me formou,
fez minha alma e o coração
da matéria que sabia:
solidão mais solidão;
ensinou-me esta paisagem
que repinto na parede,
por onde vou em viagem,
onde amanho a minha sede,
onde um corpo à sua imagem
se oferece à minha rede.

A solidão me formou,
mas em mim se alimentou,
cresceu em mim e comigo,
e o meu amor, meu amigo,
caminho por onde sigo,
onde ninguém mais passou.

Neste exercício de ser,
quanto tempo inutilmente!


II - GRITO

Desespero de sentir a vida se esvaindo,
torneira aberta sobre um chão de pedra.
Que flor vai nascer?
O gesto não muda o sentido do vendo;
a folha não fica parada no ar.
A gente se engana com a falsa esperança
que um dia se mude o curso do rio,
e nada se faz:
fica-se olhando o mar nos chamando,
sem nada que nos detenha,
sem coragem para o salto.


III - OTIMISMO


Neste princípio de noite
quero ser otimista.
Estou só e é melhor que assim seja.
Se eu tivesse alguém comigo,
amanhã de manhã ia-se embora
e eu ficava triste.
Devo estar contente também
porque a ninguém espero;
a noite passará depressa
porque a ninguém espero;
a manhã não vai ser triste
porque ninguém vai embora.
Quero ser otimista, quero estar contente,
quero fazer tudo para não sentir
o vazio da noite.


Minibiografia do poeta:
(Responsáveis: R. Leontino Filho/Francisco Miguel de Moura)

Eu não teria nenhuma capacidade de levantar uma pequena biografia do meu amigo Edson Guedes de Morais, primeiro porque me faltariam os elementos essenciais, (a crítica mais acertada sobre sua obra tão variada), depois porque agiria apenas com o coração.

Pego, então os dados citados por R. Leontino Filho sobre o poeta, contista e editor:

"Edon Guedes de Morais, poeta e artífice (...) é um caçador de lembranças, com clarividência estética exacerbada. (...) Dotado de uma sensibilidade trágica, Edson é um profundo conhecedor da fragilidade humana. "Dispersão", seu primeiro livro de poemas (Ed. Clube dos XII, 1956) já apontava na direção do desassossego, o poeta margeando o mundo. Só desse modo a poesia é necessária. Em 1963, publica o livro de contos "Um homem e os homens lá fora" (Edição GRD), surgindo o contundente e vigoroso contista, celebrado por renomados críticos, entre os quais Fausto Cunha e Antônio Olinto. O romance "Artesãos do nada", publicado em capítulos semanais do Diário de Brasília (1974), revelaria um denso e envolvente narrador, senhor pleno do seu ofício de escrever-criando. Navegando noutros mares, em 1977, surge "Monstro", besta fera como saiu nos jornais (peça montada pela Cia. de Teatro Grutta, sob o patrocínio do SNT/MEC), o dramaturgo como testemunha privilegiada do seu tempo e de sua gente. A novela "Outra lembrança, outra casa, outros mortos", lançada pela primeira vez em 1976, na Coleção Azulejo, de S. Luís-MA, receberia nova edição a cargo de André Quicé Editor (Brasília, 1984)".

Por mim, acrescentaria que ele é um poeta de doce lirismo, embora traçando solidão e solidões. Como contista, achei-o tão forte quanto raro, no estilo e na criação ficcional. Diria como disse Ascendino Leite: "Se fosse escrever contos, gostaria de escrever como ele, com tamamnha propriedade, profundidade e arte". Outros livros foram lançados. E a atividade cultural e artística de Edson Guedes de Morais, depois que passa a fixar residência em Recife, mais e mais se esmerou, tendo criado a editora alternativa "EGM", pela qual vem divulgados os melhores poetas deste país. Como Leontino Filho falo na sua fixação em Recife, porque ele, nascido em Campina Grande/PB, 1930, andarilhou por terras diversas: Ceará, Bahia, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Brasília.

Admirável também é ainda haver no mundo pessoas generosas como Edson Guedes de Morais, e ao mesmo tempo sendo um artista que não faz concessões ao que não é bom e belo na literatura. Sinceramente, é um milagre. Ele merece todas as homenagens nossas, nestes seus 8O anos de vida tão produtiva e tão útil, ao contrário do que diz seu poema aqui apresentado.
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