sábado, 9 de janeiro de 2010

POEMAS CONSTRUTIVOS E OUTROS


Crítica

Fernando Py
Poeta e crítico literário

1

Poemas construtivos, de Sílvio Castro (Rio de Janeiro: Edições Galo Branco, 2007). Poeta e ensaísta de renome, Sílvio Castro apresenta seu novo livro sob o signo da “construção”. No texto de abertura, “Construção do poema” (pg.13), bem como nos poemas das séries “Construtura”, “Edificação do amor” e “Construção”, e em muito mais, está presente a preocupação com a estrutura e a formação dos versos e do poema. Não à maneira parnasiana, de que Bilac é o paradigma com a “Profissão de fé” e, principalmente com o soneto “A um poeta”. Mas de modo reflexivo, intimista, como se “ouvisse” de fora a construção dos versos, como se eles fossem formados independentemente de sua vontade. De todo modo, Sílvio Castro renova e revigora a metapoética de quem se debruça sobre as razões da formação e existência do objeto poema. Convém reparar que todos os poemas da série “Construtura” estão escritos em prosa, o que reafirma a intenção programática dos textos. E o poeta está sempre se referindo às noções de “construção”, “desconstrução”, “edificação”, “espaço”, e insiste na predominância do concreto sobre o abstrato. Assim, não apenas dedica um poema ao nosso grande Oscar Niemeyer, como se inspira livremente em poemas alheios (“O engenheiro” de João Cabral de Melo Neto, “Construção” de Chico Buarque), desde que lhe sirvam para confirmar seus propósitos construtivos. O livro de Sílvio Castro é de leitura atraente, uma pequena obra poética de alto valor. Parabéns.

2

Antologia: poemas escolhidos pelo autor, de Francisco Miguel de Moura (Teresina: Edições Cirandinha, 2006). Como indica o título, é uma recolha de poemas escolhidos. O autor é um dos maiores poetas piauienses vivos – senão o maior –, e esta avaliação se baseia principalmente no senso de construção dos poemas – sobretudo os de forma fixa como os sonetos –, bastante diversificados quanto à expressão, ao vocabulário e, principalmente, quanto às imagens. O poeta igualmente varia muito quanto aos temas, e quer verseje sobre o amor, o tempo, as indagações existenciais de todo tipo, não há dúvida de que demonstra seu extraordinário valor, fazendo com que seus textos sempre mereçam uma leitura cuidadosa e – por que não? – entusiasmada.

(in Jornal “Tribuna de Petrópolis”, 20-03-2009, Caderno “Lazer”, p.5).


POESIA
de Fernando Py

O BECO

a Carlos Drummond de Andrade

Que se passa naquele beco
onde nunca estive?
Vislumbro o muro de passagem:
sombras, manchas, rastros
de existência.
Quem o habita, se é que o habita
alguém, se é que o beco
existe como existem
seres e coisas que vejo?
Quem derrama nesse recanto do universo
o sinal de vida, a marca indelével
da matéria organizada?
O que existe fora do meu
alcance de vista? Quem brinca
de esconder quando relembro
o muro caiado, a rua esquecida?
O que não vejo, pressinto:
existe mesmo ou é extinto
para mim, ignorado
como esse beco aonde nunca fui?

O ESQUIZOFRÊNICO

No seu delírio vai compondo os gestos
diante da platéia inexistente;
ele próprio é a platéia, mas não sente
do espetáculo mais que os pobres restos
que a memória lhe acende nos esgares
da fisionomia descomposta.
No seu delírio a fala, sem resposta,
se resolve em grunhidos singulares,
num discurso arbitrário de fonemas
reduzidos à simples expressão
de sons primevos que de sempre estão
revelando carências, e as extremas
ruínas de seu cérebro em pedaços.
Os gestos multiplicam-se em algemas
e a platéia se cala, membros lassos.



Biografia:

Fernando Py de Mello e Silva - Nasceu no Rio de Janeiro em 13 de junho de 1935, de família gaúcha. Poeta, colunista, crítico literário, tradutor, fez o curso primário no Externato Coração Eucarístico, o ginasial no Santo Inácio e colegial no Colégio Mallet Soares, todos na cidade natal onde viveu até 1967, quando se mudou para Petrópolis, onde reside. Formou-se em Direito (UERJ), em 1960, porém nunca advogou. Funcionário da CAPES (Min. da Educação 1958-59), da Procuradoria do Estado do Rio Grande do Sul na Guanabara (1960-62) e metorologista (Inst. Nac. de Meteoroligia, Min. da Agricultura, 1962-94), quando se aposentou. Colaborou em diversos jornais do Rio, S. Paulo, B. Horizonte e Porto Alegre. Trabalhou com redator e tradutor da Grande Enciclopédia Delta-Larouse e a Mirador Internacional. Traduziu obras de autores importantes como Marcel Proust, Marguerite Duras, Honoré de Balzac, Saul Bellow e outros. Atualmente assina coluna do jornal "Tribuna de Petrópolis. Alguns livros publicados: "Aurora de Vidro", Rio, 1962; "A Construção e a Crise", Rio, 1969, "Sentimento da Morte & Poems Anteriores"(antologia), 2003, Goiânia - GO, entre tantos outros. Ganhou alguns prêmios literários importantes e recebeu (15-4-2003) o título de "Cidadão Petropolitano Honorário". É casado desde 1963 com Maria Soares de Mello e Silva e tem três filhos e quatro netos.







Um comentário:

Thiago Elloard disse...

Queria deixar para vocês o endereço do meu blog, no qual posto as minhas reproduções de pensamentos (nome que dou ao que escrevo).
aguardo respostas, obrigado.

thiagoelloard.blogspot.com (BLOG)
thiagoelloard@bol.com.br (E-MAIL)

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