sexta-feira, 24 de abril de 2009

BUROCRACIA É FOGO!


Francisco Miguel de Moura*



Há casos e acasos. Não sei se o que me contaram, leitor, fica numa ou noutra categoria. Não tem importância. Burocracia é fogo. Não sou eu quem vai criar mais uma burocracia, aqui: a das palavras. Conto uma dessas verdades comuns, um caso real sucedido não comigo, mas com um colega. Estava ele solicitando, de certa repartição que tem como símbolo o leão, uma certidãozinha de quitação com o imposto lá, dela. Levou os documentos necessários. E, mesmo sendo um aposentado de 75 anos de idade, assinou requerimento, recebeu ficha com o número. E lá vem a demora, cerca de uma hora ou mais. Tinha que aguardar que o monitor da sala de espera lhe mostrasse o número de sua ficha. Mas finalmente foi atendido por uma moça – diz assim por causa da idade da funcionária. Ela lhe disse que a certidão negativa não poderia sair, pois que o cidadão estava com dívida vencida. Sua reação foi pronta:

- Não, não é verdade. Não devo nada.

- Mas aqui consta um real de débito em seu nome.

- Eu pago no banco, os bancos não erram, e pago antes do vencimento. Quer que lhe mostre os recibos?

- Não, eu me guio pelo que está no computador, na internete.

- É erro e esse erro contábil aí ou é da sua repartição ou do banco, não é meu. Não posso responder pelas falhas alheias. Resolva com o banco. Quem deve é o banco.

- Mas a dívida é sua.

- Não é, mas sendo somente um real, eu pago. Até de esmola se dá.

- Mas não podemos receber apenas um real – o menor valor pelo qual um “darf” pode ser emitido é de dez reais.

- Assim, não pago. Como é que vou pagar sem dever, ainda por cima mais imposto, num país onde a carga tributária é uma das maiores do mundo?

- Mas quando você precisar de outra certidão vai ter que dar a mesma explicação.

- Não tem importância. A certidão tem que sair, porque eu não devo.

Ela, àquela altura, já estava com a certidão negativa na mão e foi passando-a ao cliente. O tempo já se tinha passado, eram quase doze horas. É claro que o cidadão saiu meio irritado com a burocracia: – “O cidadão paga suas contas em dia, tem toda a documentação em mão e ainda lhe vêm dizer que deve!”

Na hora do questionamento acima, ou seja, do “diálogo” entre o cidadão e a funcionária, depois de muito solicitar-lhe explicação para aquela mancha de um real em seu nome, ela disse secamente: “Deve ter sido por causa do vencimento num feriado e o banco não pagou o juro correspondente, quando prestou conta”.

E ainda teve a audácia de dizer ao cidadão que ele devia, que o débito de um real era seu, que se o banco errou, não havia como receber dele etc.

Burocracia não é mole, é uma espécie de prisão perpétua a que todos os cidadãos estão submetidos, sem direito a apelação, deve ter falado, com os seus botões, o indefeso cliente.

Para reforçar a revolta dele contra o governo, porque não poderia ser contra a empregada, lembro o que parece mentira: O Brasil, um dia, teve um Ministério para a Desburocratização. E como deu certo, não para ela, a burocracia, mas para o cidadão, o governo – não importa qual – acabou com o Ministério.

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*Escritor, Membro da Academia Piauiense de Letras, email: franciscomigueldemoura@superig.com.br

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