segunda-feira, 23 de junho de 2008

AS ACADEMIAS DE LETRAS E A VIDA ACADÊMICA



José Afrânio Moreira Duarte*

Como é público e notório, a primeira academia que se tem notícia foi fundada na Grécia Antiga. O herói grego Academus fez construir um ginásio num bosque situado nos arredores de Atenas. Nele Platão fundou uma escola de ensino filosófico em que dialogava com os alunos, isto no ano 385 Antes de Cristo. Como o lugar era conhecido como Jardim Academus, a escola de Platão ficou sendo chamada Academia Platônica. Ela instituiu também o culto, às figuras mitológicas, nas quais todos criam, de Apolo e das Musas. Desde então um grupo que se reúne para estudos de temas literários ou mesmo diversos ficou sendo conhecido como componente de uma academia. Etmologicamente a palavra vem do grego Akadêmia, via língua latina.

No terreno literário propriamente dito, embora hajam existido outras antes, a importância suprema fica mesmo é com a Academia Francesa, fundada em 1626 pelo Cardeal de Richelieu, visto que a partir dela as academias do mundo inteiro, na quase totalidade, passaram a seguir seu modelo, ou seja, têm quarenta cadeiras, cada qual com seu patrono.

À proporção que vão morrendo os fundadores, já que o cargo é vitalício, são eleitos os sucessores. Há numerosas academias em muitos países, principalmente na Itália e nos Estados Unidos da América do Norte. Neste último país citado quase todas são Academias de Ciências, Letras e Artes, não cuidando apenas de literatura.

Como na França a principal entidade do gênero não se chama Academia Francesa de Letras, mas apenas Academia Francesa podem integrá-la intelectuais não escritores, embora os literatos predominem. Uma outra particularidade da Academia Francesa é que não se exige a nacionalidade francesa para o ingresso de um acadêmico, basta que ele escreva suas obras em francês. Marguerite Yourcenar, a célebre autora das obras primas “Memórias de Adriano” e “A Obra em Negro”, entre diversos outros livros, era belga naturalizada norte-americana. Foi a primeira e até hoje a única mulher a ingressar na Academia Francesa.

Outra academia de grande repercussão internacional e a Academia Sueca, pois ela é que concede, entre outros, o Prêmio Nobel de Literatura, o mais importante do mundo no gênero.

No Brasil a entidade mais notável, literariamente falando, é a Academia Brasileira de Letras, fundada por um grupo de escritores, liderados por Lúcio de Mendonça, em 15 de dezembro de 1896. Machado de Assis, para mim o maior escritor brasileiro de todos os tempos, foi unanimemente aclamado presidente. Embora fundada em 1896, a sessão inaugural da Academia Brasileira de Letras só ocorreu em 20 de julho de 1897.

Por influência da Academia Brasileira de Letras foram aparecendo através do país outras entidades congêneres, estando entre as primeiras delas as do Pará, Maranhão, Piauí, Ceará, São Paulo e Minas Gerais. Com a Academia Mineira de Letras houve uma particularidade visto que não foi fundada na capital e sim em Juiz de Fora, então a mais importante cidade do Estado, no dia 25 de dezembro de 1909. Somente em 1916 foi transferida para Belo Horizonte.

Segundo penso, a confraternização nos meios acadêmicos é de muita importância, principalmente porque, embora existam, não são comuns às famílias de escritores, ficando cada um com que isolado literalmente do meio familiar. Existem grupos de escritores que na maioria dos casos se reúnem em bares, mas a vida acadêmica é a que me parece ideal para o convívio literário, exposição de planos, troca de idéias sobre livros literários e assim por diante. Isto sem contar a realização de concursos literários, palestras, pequenos cursos e tardes ou noites de autógrafos, entre outras coisas mais. A grande maioria da população respeita as academias e valoriza os acadêmicos, mas justamente nos meios literários, mormente entre escritores jovens, é moda menosprezar e tentar desmerecer as academias. Em muitos casos, contudo, com o passar dos anos os antiacadêmicos mudam de posição. Por exemplo, é do conhecimento de todos que a semana de arte moderna realizada no Teatro Municipal de São Paulo em 1922 tinha entre seus objetivos primordiais “investir contra o marasmo das academias”. Alguns dos participantes mais entusiasmados eram os então jovens Menotti Del Pichia, Cassiano Ricardo e Guilherme de Almeida, indubitavelmente uma tríade de grandes poetas. Pois bem, mais tarde, já na maturidade, todos três cometeram o exagero de ingressar na Academia Paulista de Letras, e, como se não bastasse, na Academia Brasileira de Letras, também.

Ao entrevistar Jorge Amado perguntei-lhe: “Dizem que quando jovem você era frontalmente contra as Academias de Letras, mas, afinal, terminou sendo acadêmico. Como é mesmo que foi isto?” Eis a resposta: “Com a idade e a experiência a gente deixa de ser maniqueista. Felizmente”.

Eu também fui anti-acadêmico na juventude, mas depois concluí e até escrevi que o certo é cada qual escolher e seguir seu próprio caminho, respeitando sempre os caminhos dos outros. Hoje considero justo motivo de orgulho para mim ser membro da Academia Mineira de Letras e da Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais, além de sócio correspondente de outras em Minas Gerais, ou em Belo Horizonte.

Parece-me que o anti-academismo é uma doença sem gravidade que ataca principalmente os moços, como as espinhas.

Felizmente, na maioria dos casos, o mal tem cura. É só deixar o tempo ir passando...

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*José Afrânio Moreira Duarte, escritor brasileiro, poeta, contista, crítico literário e membro da Academia Mineira de Letras, morava há muitos anos em Belo Horizonte, onde faleceu no dia 03-06-2008. Originário de Alvinópolis-MG, onde nasceu 8-5-1931, publicou “O menino do parque” (contos, 1966), "Fernando Pessoa e os caminhos da solidão" (ensaio, 1968), “A muralha de vidro” (contos, 1971), entre outras obras, tendo recebido importantes prêmios de instituições de Minas, Rio e São Paulo.

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