domingo, 13 de novembro de 2022

 


EVASÃO

(ou o templo de meu tempo)

            Francisco Miguel de Moura*

O templo do meu tempo se abateu,

alongando qual aranha que se tece

e vai tecendo, crescendo em revoada,

em minha alma desmedida. E assim,

não é moderno, antigo nem amigo,

vem de antes do relógio e da fadiga,

no sonho de um autor desconhecido.

Templo que não dá tempo, seu tempo

é meu olvido... E a desdita humanidade?

Como apagá-lo, fagulha por fagulha,

sem o ribombar das dores de um trovão?

Sem raio nem neblina, enxovalhando

o vento ou algum ar das desventuras,

sem pulmão pra suster um só suspiro?

Da janela de meu templo, inda pagão,

contemplo o sino e o forte bimbalhar

no ar de deus nenhum, de deus ninguém.

E passo a acreditar-me um anjo nu

que não sobe nem desce... Já sem chão,

 suporte do presente, passado e do futuro:

 trigêmicos irmãos, na orfandade.

____________

*Francisco Miguel de Moura, poeta brasileiro.

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