EVASÃO
(ou o templo de meu tempo)
Francisco Miguel de Moura*
O templo do meu tempo se abateu,
alongando qual aranha que se tece
e vai tecendo, crescendo em revoada,
em minha alma desmedida. E assim,
não é moderno, antigo nem amigo,
vem de antes do relógio e da fadiga,
no sonho de um autor desconhecido.
Templo que não dá tempo, seu tempo
é meu olvido... E a desdita humanidade?
Como apagá-lo, fagulha por fagulha,
sem o ribombar das dores de um trovão?
Sem raio nem neblina, enxovalhando
o vento ou algum ar das desventuras,
sem pulmão pra suster um só suspiro?
Da janela de meu templo, inda pagão,
contemplo o sino e o forte bimbalhar
no ar de deus nenhum, de deus ninguém.
E passo a acreditar-me um anjo nu
que não sobe nem desce... Já sem chão,
suporte do
presente, passado e do futuro:
– trigêmicos irmãos,
na orfandade.
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*Francisco Miguel de Moura, poeta
brasileiro.
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