– Escritor, membro da Academia Piauiense de Letras.
Na publicação
de “Um depoimento pós-moderno” Edições,
Cirandinha, 1989, eu dizia já prever a volta do romantismo no começo do séc.
XXI, porque poetas e leitores não vivem sem poesia.
Acabo de
receber um e-mail do grande poeta renovador mineiro, Márcio Almeida, que nas
décadas passadas, melhor dizendo desde os anos 1960, revoluciona a poesia
brasileira com seus livros e ações em torno dos movimentos poéticos, através do
também poeta mineiro Paschoal Motta, amigo dele e meu, cujo teor é o seguinte:
“Meu caro Paschoal, ‘Não panfleteie
ideologia, / não holografe em atari, / não louversonhe as maras, / não palavre:
Signatari” (Márcio Almeida, Assassigno, 1987). Em homenagem ao Décio
Pignatari, n. 20-8-1927 (Jundiaí) – f. 02-12-2012 (São Paulo), para quem o
poema é o “disigner” da linguagem, que conheci em evento, quase um fracasso
absoluto, em Belo
Horizonte , juntamente com Carlos Ávila, que também perdeu o
pai faz pouco tempo, escrevi a quadra acima, inclusa no Assassigno, cujo
revival agora está de volta na publicação de “Leituras indesejáveis”, que você
receberá nesta semana. Outro dia você me mandou um e-mail que também me deixou
um pouco perplexo. É que as pessoas boas estão morrendo, os jornais mal e
porcamente registram e rapidamente caem em esquecimento quando não no silêncio cínico,
caso dos nossos Henry, Adão, Duílio (Gomes), José Afrânio Moreira Duarte e
tantos outros que se vão e pronto. E assim será, com toda certeza, também
conosco. Temo pelo absoluto
ostracismo em menos de uma década após a nossa morte. Meus filhos nunca me
perguntaram o que estou produzindo, nunca leram artigo meu publicado em jornais,
não conversam comigo sobre Literatura, nunca me perguntaram sobre a qualidade
de um livro que lêem. Amanda já anunciou que quando eu morrer vai dispor de
minha biblioteca em dois tempos: a chegada e a saída do caminhão para doar tudo
para uma entidade. Isto, comigo. Não tenho referência se existe uma biblioteca
com o nome do Adão que o reverencia, idem com o Henry e assim sucessivamente. O
neoliberalismo com sua forçada equiparação “por baixo” faz com que as pessoas
se achem todas no mesmo nível e assim todas se dão o direito de serem
rigorosamente iguais em
tudo. Dia desses quase rompi com um amigo porque ele estava
espalhando via internete que para produzir miniconto o conhecimento da
gramática era inútil, desnecessário. Sou pessimista em relação à sobrevivência da
Literatura do futuro-já, mormente com a expansão do tablete e você lerá eu já
tratando do assunto em “Leituras indesejáveis”.
As pessoas (bem menos do que hoje) continuarão lendo, mas textos curtos,
impactantes, encomendados. O que chamamos de Literatura tornar-se-á “cult”, arte devocional de apreciadores
muito especiais. É um palpite. Sem uma “Sociedade dos Poetas Mortos”, sem uma
“sociedade” que nos lembre a todos, indistintamente, além de virarmos pó,
nossos nomes serão apagados de quase tudo. Seremos lembrados
historiograficamente: ou porque, no seu caso, foi editor do SLMG (Suplemento
Literário do Minas Gerais), ou porque foi professor de uma faculdade em DV, ou
porque nasceu SPF e construiu uma biblioteca. Quantas pessoas se lembraram de
um poema nosso? E quando essas pessoas morrerem? Lembra-se do filme “Farenheit 45” , do François Truffault? Não
é à toa se ele é um dos meus prediletos. Sou mesmo veementemente contra
Academia, mas ela tem uma vantagem: respalda vida e obra dos autores; conserva
sua memória, vira e mexe, traz à tona o legado daqueles que realmente tem
valor. Outro dia li na “Folha de São Paulo” que amigos cariocas do Bartolomeu
Campos de Queirós iam prestar homenagem a ele no Rio, com exibição de
documentários, exposição de suas obras etc. Está claro que sua morte ainda é
recente, mas foi lembrado. Dinorah Maria do Carmo me enviou e-mail ontem à
noite convidando para a leitura de poemas de Bueno da Rivera, em Santo Antônio do
Monte, que também está sendo lembrado. O que falta mesmo é uma sociedade que
preserve a memória dos autores, não os permita serem esquecidos, os mantenha
vivos para os pósteros, pois em vida foram lidos, premiados, serviram de
exemplo, dignificaram o Estado”.
Na resposta do poeta Paschoal Motta há jóias como: “Há muito que fazer, Márcio, e principalmente pela humanização da Poesia Escrita, começando com a retomada do lirismo.”
Aquela volta ao
romantismo de que falei no início não é mais do que o lirismo poético de um
Márcio Almeida, autor deste depoimento fabuloso que nos enviou, assim como o do
próprio Paschoal Motta, numa linguagem nova, com originalidade, por isto mesmo
querendo que o fogo da Literatura seja passado à frente como o das tochas
Olímpicas. Todos os povos são românticos quando querem sobreviver, pelo menos
no nome, por ter feito alguma coisa boa. E os escritores, justo porque escrevem,
naturalmente pensam na escrita, na prosa e na poesia, no nome, como forma de
sobrevivência histórica. “No princípio era o Verbo e o Verbo estava
junto de Deus e o Verbo era Deus”. (Evangelho, segundo São João). Nisto eu
acredito. Como acredito que fim também é o Verbo e o Verbo é Deus. E Deus é
poesia.
Tudo isto é linguagem, tudo isto é poesia,
tudo isto é romantismo.
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*Francisco Miguel de Moura é um dos poetas contemporâneos que mais produzem, tendo cerca de 42 livros publicados, entre poesia, crônica, conto, romance e crítica literária, matéria em que é versado e foi lembrando pelo grande crítico Wilson Martins, em sua "História da Crítica no Brasil".
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