terça-feira, 13 de novembro de 2018

ALGUNS POEMAS DE ELMAR CARVALHO (I)


Elmar Carvalho*

O BÚZIO 

 o búzio
- pequeno castelo
ou gótica catedral –
sobre a mesa avança
envolto em ondas e vendaval

anda ondulante
onda cavalgante
onda ante onda

atraído pelo chamado
do mar avança
chamado que carrega
nas espirais e labirintos
de sua concha côncava

avança e
lança sobre mim
a tessitura exata
de sua arquitetura
abstrata e surreal

avança unicórnio lendário
protuberante
rinoceronte bizarro
surfista extravagante
em forma de chapéu

lentamente
avança co-movido
pelo chamado das ondas
que em si encerra
em seu ventre vazio
onde o vento em voluteios
é a própria voz do mar

oh, búzio caprichoso
como as curvas e volutas
de um corpo de mulher... 




METAPOEMA

As meadas e as palavras
são labirintos e teias.
Nelas os poetas se elevam;
nelas as moscas se enleiam
e se debatem em vão.
Os poetas são.
As moscas, não. 

ENIGMA 

entre o som 
         o sono 
         o sonho 
         a sombra e a sobra 
        eu me decomponho
            em escombros
em farpas e agulhas
      escarpas e fagulhas
      desfeito enfim
      em fogos de artifício
      feito estrelas de mim
esfinge autoantropofágica que
não se decifrou e que a si
mesma se devorou 

INSÔNIA

No silêncio abissal
da noite estagnada
a engrenagem pesada
do tempo se desenrola
e desaba sobre mim.


As botas cadenciadas
das horas marcham
 - lentas lesmas –
marcham infinitamente
na noite sem fim...




NOTURNO EM DOR MAIOR

na noite ca’lad(r)a
um cão ladra
sem resposta
um galo canta
sem o eco doutro galo
um vaga-
lume vaga
sem lume
vaga- rosa/mente
demente
na noite vaga
uma ave
noctívaga
navega na vaga
do m’ar sem movimentos
nos cata-ventos
       sem ventos
e de mirantes
       sem mira/gens
a morte espreita
nos olhos vidrados
do enforcado. 

EGOCENTRISMO

       espirrei
na réstia de luz
da janela de meu quarto
e fiz surgir um
            arco-íris
            arco-do-triunfo
sob o qual
napoleonicamente passei
sobre o qual caminhei
em busca do
          velocino de ouro
coroado com o
          l’ouro
de minha própria
.alquimia. 



GRAN FINALE

Desmanchei
com minhas mãos
que os criara
os deuses em que cria.
Desfiz a imagem que fizera
da mulher amada.
Perdi a fé em tudo
como quem nada perde.
Depois
gritei, berrei,
chorei gargalhando
e resolvi ficar louco.
Depois de doido
resolvi tentar a sorte
          sal-
                tan-
                      do de cabeça
do alto do arranha-céu. 
_________________
* Poeta e prosador piauiense, membro da Academia Piauiense de Letras.
                      N.B. - Esta edição foi autorizada pelo Autor.
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