sexta-feira, 12 de março de 2010

“CLIP” – ANOS 60 - LITERATURA DO PIAUI





Palestra sobre os Anos 60 - Piauí





Francisco Miguel de Moura**




Reunidos aqui, em torno da Literatura Piauiense, onde se encontram participando três dos principais membros do Círculo Literário Piauiense (CLIP) – Francisco Miguel de Moura (este que lhes fala), Hardi Filho e Herculano Moraes, – poetas e prosadores que se destacam no cenário literário do Estado e já com divulgação e crítica em vários Estados e no Centro-Sul do país, é o momento de colocar-se os pontos nos ii. Primeiramente com relação à existência e independência do CLIP.

Ele foi fundado oficialmente em 2 de abril de 1967, mas antes houve uma preparação que eu diria bastante boa. Praticamente, esse movimento começou com minha aproximação com os escritores Herculano Moraes e Hardi Filho, em 1964, quando eu acabava de fixar residência em Teresina, em virtude de minha transferência como funcionário do Banco do Brasil para nossa Capital. Eu vim acossado pela “revolução de 64”, que não queria ninguém com idéias, muito menos socialistas para a compreensão da sociedade. As apresentações foram feitas pelo teatrólogo e ator Tarciso Prado, que também se integrou a nós, na tarefa de buscar os valores piauienses do passado e incentivar os do presente. Assim, os anos de 1965 e 1966 são de preparo para a criação oficial do movimento. Não pensamos em nada que fosse protestar contra a geração anterior porque a geração anterior, a da revista “Meridiano”, estava praticamente esgotada, com os seus três representantes principais, O.G. Rego de Carvalho, H. Dobal e Paulo Nunes morando fora do Piauí, em Brasília ou Rio de Janeiro, – e a Academia Piauiense de Letras praticamente parada, na mornidão de uma presidência sem projetos, a cargo do Des. Simplício Mendes. Não éramos contra a Academia, éramos contra esse estado de coisas. Não havia contra quem e o que protestar. Havia um vazio nas letras. Éramos jovens escritores e poetas querendo mostrar nossos escritos e nossos livros: – Havia Hardi Filho, premiado pela Prefeitura Municipal de Teresina, com seu primeiro livro “Cinzas e Orvalhos”(1964), a seguir publicado, e “Areias”, em 1966, de Francisco Miguel de Moura. E no ano anterior, Herculano Moraes lançara “Murmúrios ao Vento”, com uma poesia ainda verde, romântica. O autor viria a amadurecer como poeta mais tarde com “Pregão” e “Seca, Enchente e Solidão”, sobre os quais escrevi positivamente. E não sou crítico de escrever sobre o que não é bom. Sou sincero e contundente. Foi o próprio Herculano quem diria mais tarde que o maior acontecimento literário/editorial de 1965, tinha sido o livro de Castro Aguiar, “Caminho de Perdição” confirmação do sucesso anterior de “Adolescente de Rua” (1962), autor que também fez parte do CLIP, assinando seu estatuto.
Que mais havia? Fontes Ibiapina escrevendo seus contos, dando prefácios aos novos escritores, como foi o caso de “Areias”, e J. Miguel de Matos, com os seus “Caminheiros da Sensibilidade”, propagando os poetas do passado e do presente, com sua crítica sempre elogiosa. Ambos vinham do movimento “Meridiano”. Nada mais a comentar sobre literatura que seja de grande monta, dos anos 50 nos anos 60, década do nascimento do CLIP.


Foram os anos da nossa geração.

O CLIP (Circulo Literário Piauiense) foi constituído com os seguintes escritores, poetas, romancistas, contistas, jornalistas, historiadores, cronistas e teatrólogos): Herculano Moraes (presidente), Osvaldo Lemos (vice-presidente), Hardi Filho (secretário), Francisco Miguel de Moura (tesoureiro) e os demais membros: Geraldo Borges, Castro Aguiar, João Henrique de Sousa, Tarciso Prado, Benoni Alencar, Honorato Rocha, Raimundo Vilarinho, Cacilda da Mata, Rosa Maria Castelo Branco, Joaquim Soares, Wagner Lemos e Francisco C. Viana. Ao todo, 16 fundadores. A diretoria foi empossada logo em 9 de abril do mesmo ano de 1967, com festa no Teatro de Arena, na Praça Mal. Deodoro, a cujo evento foram convidadas e compareceram as seguintes autoridades: J. Miguel de Matos, Nerina Castelo Branco, Lucimar Ferreira Sobral, Pedro Lemos e Jofre do Rego Castelo Branco, respectivamente, escritor, acadêmica da APL, Gerente do Banco do Brasil, Delegado Regional do Trabalho e Prefeito Municipal de Teresina. Muita gente, curiosos, estudantes, professores, poetas iniciantes estiveram presentes, lotando o teatro-recém construído. Na ocasião, além dos discursos de praxe, houve os seguintes lançamentos: Nº 1º (que viria a ser o único) do “Jornal do CLIP” e o livro de contos “Flagrantes da Vida”, de João Henrique Sousa, e declamação de poemas por Hardi Filho, Herculano Moraes, J.Miguel de Matos e por quem mais quis fazê-lo. O acontecimento foi registrado pelo jornal “O Dia”, na sua primeira edição.

O “JORNAL DO CLIP” teve uma edição tranqüila, pois Herculano Moraes era jornalista, enquanto a publicidade comercial fora de minha competência. Angariamos recursos das seguintes firmas: L. Noronha & Irmão, Dist. de Peças e Acessórios Ltda., Livraria M. A. Tote, Papelaria São Francisco, Agropec-Comércio e Representações, Loteria Estadual do Piauí, Farmácia Saúde do Povo, Tipografia Antônio Lopes, Editorial Piauí Ltda., Casa Leão (Tajra & Fonseca), Florêncio Bento Bezerra & Cia. e Editora Artenova Ltda.

Posteriormente juntou-se à turma do CLIP, embora não oficialmente, o contista Magalhães da Costa, que já vinha publicando seus contos no Ceará e no “Almanaque da Parnaíba”, os quais viria a reunir, nos livros “Casos Contados”, 1970, e “No Mesmo Trilho”, 1972.
Portanto, se os anos 50 foram da geração “Meridiano”, os anos 60 foram nossos, da geração “clipiana”. E continuamos pelos anos 70 até o meado da década, com os seguintes acontecimentos literários: Hardi Filho publica “Gruta Iluminada” (1971); Francisco Miguel de Moura publica “Linguagem e Comunicação em O.G. Rego de Carvalho”, pela Artenova, Rio, 1972, lhe valendo a consagração como crítico literário nacional, e “Pedra em Sobressalto”, 1974; em 1975, Herculano Moraes publica “A Nova Literatura Piauiense”, um ótimo livro de crítica literária sobre nossa geração, especialmente. Mas, além dessas publicações e uma ou outra que não me vem à memória no momento, os “clipianos” ou o movimento “CLIP” traria conseqüências da maior importância para a cultura do Piauí, cite-se, por exemplo, a fundação da UBE-PI (União Brasileira dos Escritores do Piauí), em 21.10.1973 e a fundação da Secretaria de Cultura, no mesmo ano. Naquela, observa-se que o grupo do “CLIP” estava em peso, inclusive assumindo a presidência; e nesta, se consultados os jornais e arquivos de rádio da época, vão observar como lutamos pela idéia, levando-a às autoridades e requerendo sua realização, e depois participando nos principais eventos por ela promovidos, inclusive da revista “Presença”.
É inconcebível verdadeira e historicamente que se diga que o “CLIP” não existiu como movimento literário. Apenas no tempo em que se reuniu oficialmente – um ano – no Teatro de Arena, fizemos lançamento de livros, realizamos peças teatrais, recital de poemas e as reuniões de todos os domingos, onde discutíamos o rumo de nossa cultura, de nossa arte. Além disto, cada qual por seu meio, antes e depois da existência oficial mencionada, fazia programas de rádio (naquele tempo aqui ainda não existia canal de tevê), escrevia nos jornais, estava presente a todos os lançamentos, todas as festas da cultura, das artes e das letras. E líamos muito, e estudávamos muito, e tomávamos conhecimento, através dos jornais, do que se passava no Rio e São Paulo, havendo, é claro, uma certa identificação de nossa parte com essas informações que recebíamos. Integrantes do movimento, extraoficialmente, como Gregório de Moraes, de vez em quando vinha do Rio visitar a terra, e então fazíamos reuniões sempre proveitosas. Herculano Moraes chegou a escrever que eu fui o primeiro poeta concretista do Piauí. Realmente, “Areias” já apontava um pouco para isto e em “Pedra em Sobressalto” realizei experiências mais profundas.

Da troca de nossas experiências, resultou que no início Hardi Filho, por exemplo, fazia principalmente sonetos e eu a poesia chamada de “modernista”. Tempo depois, Hardi Filho passa a dedicar-se ao verso livre e às pesquisas e eu, a pesquisar e escrever sonetos, sempre buscando conformá-lo com os novos tempos. Já Herculano Moraes avançava no rumo do melhor de sua obra acima apontada e fazia os preparativos para ser o segundo historiador de nossas letras, com “Visão Histórica da Literatura Piauiense – o primeiro, como se sabe, foi João Pinheiro, ainda da geração acadêmica.

A geração seguinte – “do mimeógrafo, marginal ou dos anos 70” – nos acompanhou. Não se pode dizer que ela nos contestou nem que tenha documentos probatórios de quando começou. Neste sentido é meio aleatória. Mas é herdeira da leitura de Torquato Neto e Mário Faustino, que chegavam (seus livros) bem tarde ao Piauí. Ela também sentiu certa influência do CLIP, através dos seus cultores, os quais inda hoje continuam, por exemplo Francisco Miguel de Moura, Hardi Filho e Herculano Moraes. E isto foi bom. Já havia conflitos demais, os originários da situação política brasileira. A “geração do mimeógrafo”, ou dos anos 70 começou mesmo a publicar livros a partir da segunda metade da década. Antes era muito dispersa, sem organicidade, pagando pela dispersão em grupinhos, ou pela situação política. E a última alternativa (a ditadura) não foi “privilégio” somente dela. Nós pagamos caro por isto, também”.

Finalizando, afirmo que, desta novíssima geração, há poetas picoenses, cito os mais atuantes e melhores – Ozildo Barros e Vilebaldo Nogueira, vivendo nesta terra gloriosa de Fontes Ibiapina. Uma recomendação final a todos, a qual parte de quem já o fez: Leiam muito, não acredito em cultura e sabedoria de quem não leu romances, em quem não conhece a poesia. Aliás, sabedoria é um atributo dos velhos, que me desculpem os jovens, certamente inteligentes e cheios de vontade. Mas só chegarão à sabedoria se persistirem durante toda a vida. Um sábio precoce pode ser um exceção que fura a regra. Jovem e sábio, historicamente, somente Jesus.

Picos possui muitas coisas boas, a ALERP, grupos de teatro, cantores e compositores, poetas, universidades, bibliotecas particulares, progresso em todos os sentidos. Mas lhe falta uma coisa imprescindível: uma biblioteca pública, vejo-me obrigado a declamar. Os picoenses, especialmente a juventude estudiosa e vibrante, professores e intelectuais têm que levar avante a luta pela criação da biblioteca pública. A respeito, sabe-se que no passado recente um prefeito devolveu verba que veio do Ministério da Cultura para que fosse instalada, simplesmente porque não quis preparar a burocracia para tal. Isto é inconcebível. Assim, dos cem por cento das cidades brasileiras consideradas de grande e médio porte, 75% possuem a sua biblioteca, apenas 25% não na tem. Picos está nesta estatística negra. Parabéns, Picos, por tudo o que possui e disse antes, pelo seu povo trabalhador, hospitaleiro, que me recebe sempre com muito carinho. Menos pela falta da biblioteca pública. Parabéns à Academia de Letras da Região de Picos e a sua nova diretoria, que promete escancarar suas portas à sociedade, ao povo picoense e aos visitantes. E está começando muito bem com este movimento literário que aqui acontece neste final de outubro.


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* Texto escrito a partir de anotações de uma palestra pronunciada pelo escritor Francisco Miguel de Moura, na ALERPI, III Seminário de Literatura Piauiense, em 22 de outubro de 2004, no Auditório da Associação Comercial.
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** Francisco Miguel de Moura é escritor, membro da Academia Piauiense de Letras, do Conselho Estadual de Cultura-CEC-PI, membro-fundador do Círculo Literário Piauiense(CLIP), membro-fundador da União Brasileira de Escritores do Piauí -UBEPI e autor de “Literatura do Piauí (história e antologia).

2 comentários:

pfuturefooy disse...

adimiro muito a geração clip do modernismo piauiense. Este é o conceito de cultura: demostrar caracteristicas da sociedade em que se apresentam, entreter e divertir informando. e sua geração seguiu todos esses preceitos. Pena da minha geração, por AINDA não ter verdadeiros autores.

Cristal de uma mulher disse...

Muito gosto em ler artigos do Piaui. O nosso Brasil é digno de relatos maravilhosos,mais são poucos ainda que escrevem e dilatam suas riquezas.

Um grande abraço

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