sexta-feira, 2 de maio de 2008

A CULPA É DO POVO (?)



Antônio Carlos Fernandes da Silva*

Jogaram na boca do povo que a culpa é do povo. É o povo que paga o pato. Sempre. Mas, quê fazer, meu Deus?...

Em todo ano de eleição, se apresentam candidatos dizendo-se, cada um, por seu turno, o mais honesto, casto, humilde, trabalhador, o mais preparado, profundo conhecedor dos problemas da sua comunidade, da sua cidade, do seu estado, do seu país.

Na mídia, vêem-se os tribunais, com toda a sua boa vontade, orientando o eleitor para que não deixe de votar nem de procurar fazer acertadamente a escolha ao seu candidato, a fim de não correr risco de eleger o famoso “Justo Veríssimo”.

O candidato entra nas casas do povo, pede, implora, emociona-se, chora, jura justiça e honestidade, promete o céu e a terra, e o povo, ávido por exercer a sua cidadania, orientado pelo tribunal, escolhe um deles e taca-lhe mais um voto de confiança.

Anos depois, cientistas políticos, mídia, políticos mascarados, doutores, professores, sábios, formadores de opinião estão a esbravejar: a culpa é do povo que não sabe votar.

E o eleito, lá do seu gabinete, com sua equipe de trabalho escolhida a dedo – literalmente - trabalhando incansavelmente em favor da comunidade. Da comunidade familiar. Bufando para o povo. Investimentos e gestões em obras sociais que possibilitem o povo a tirar o pé da lama e a trava do olho, nem pensar. O povo que se “exploda”.

Ao final de cada mandato, cada eleito sai mais robusto. E o povo mais definhado, decepcionado, desesperançado e até envergonhado de ouvir tanta acusação atirada sobre os seus ombros caídos, apesar de já acostumados a pagar a fava que o bode comeu.

Mas, quê fazer, meu Deus?... De lado pouquíssimas exceções, tanto faz dar no Zé como no José!... São os mesmos que já vieram, já foram, já voltaram. Não se cansam, não se saciam. E os tribunais eleitorais e de contas já os conhecem muito bem... A justiça, também.

Não tem que votar em um deles? Há outra opção? Eu acho que sim. Nestas circunstâncias, com toda a canga da culpa no pescoço, o povo só tem uma opção para se livrar dessa cruz. Não vou dizer aqui para não atiçar o eleitor nem melindrar autoridades, mas, quem já tangeu jumento, como eu e meus amigos Ivan Costa e Omar Prado, jumento levando chicoteadas, carregando duas ancoretas cheias d’água, tão pesadas que o pobre do jegue andava arqueado... Quem já tangeu jumento assim sabe o que ele fazia com freqüência no meio do caminho: apenas se deitava e pronto. Zefini.

Nesse momento, no meio do caminho, ele era a pedra. Não tinha menino no mundo que o obrigasse a se levantar e continuar caminhando com aquele peso cruel sobre o seu espinhaço. Nem com muita taca. Quando aparecia algum filho de Deus, adulto, com força e consciência arejada e retirava aquela carga do seu lombo, então ele dava uma bela descansadinha no chão frio, se espojava gostosamente e depois se levantava sem pressa sob fortes chicoteadas.

Mas a carga ficava lá no chão. Quem quisesse que derramasse a metade do conteúdo das ancoretas e as recolocasse no lombo surrado do jegue. Ao contrário, ninguém iria beber água cristalina em casa e todos iriam continuar sujos.

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*Antônio Carlos Fernandes da Silva – E-mail: ancarfes@yahoo.com.br Professor, poeta, escritor, mora em São Luís-MA

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