quarta-feira, 14 de agosto de 2024


 

EVASÃO             

            Francisco Miguel de Moura*

          (Homenagem a Drummond (v, estátua)

 

O templo do meu tempo se abateu,

alongando qual aranha que se tece

e vai tecendo, crescendo em revoada,

minha alma desmedida em ciprestes.

Não é moderno, antigo, nem amigo,

vem de antes do relógio e da fadiga,

qual sonho de um autor desconhecido.

Templo que não dá tempo a seu tempo,

é seu olvido... E a desdita humanidade?

Como apagá-la, fagulha por fagulha,

sem ribombar as dores de um trovão?

Sem raio nem neblina, enxovalhante,

o vento, em algum ar das desventuras,

sem pulmão pra suster um só suspiro?

Da janela do templo, inda pagão,

contemplo o sino e o forte bimbalhar

no ar de deus nenhum, de um desumano.

E passo a acreditar-me um anjo nu

que não sobe nem desce... Já sem chão.

____________

*Francisco Miguel de Moura, poeta brasileiro.

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