quarta-feira, 21 de março de 2012

FOTOGRAFIAS DOS ESCRITORES - CRÔNICA

 Teresinka Pereira*           

As pessoas que conhecem os escritores somente pela obra publicada (e agora pela internet) e as fotografias dos mesmos tendem a imaginá-los como seres invencíveis pelo tempo, quer dizer, que não envelhecem. Muitos nem imaginam que nós, os escritores (poetas inclusive) somos vaidosos e queremos continuar a ser glamorosos como éramos na juventude. Não permitimos que nos tomem fotografias nos congressos, nas conferências e quando os editores de antologias nos pedem para enviar um retrato tamanho carteira, mandamos algum que tiramos aos 20 anos de idade.

Estamos todos orgulhosos de que nossa obra literária se tenha desenvolvido, feito um progresso digno da nossa maturidade, mas quando nos olhamos no espelho, nosso reflexo vem da memória da nossa juventude e por isso escolhemos sempre aquela fotografia linda tirada em alguma ocasião especial.  Embora isto seja comum, esse truque pode ter conseqüências negativas algum dia em que aparecemos entre amigos que não vemos há muito tempo, ou de algum novo leitor que vai nos cumprimentar levando na mente a imagem da foto que viu na última antologia. Dito isto, temos que considerar também o poder da imaginação que é sempre ilimitado e que ao olharmos uma fotografia no papel podemos vê-la ao nosso lado transformada em uma linda pessoa, com todas as características que a beleza nos contagia: a bondade, a inteligência e o talento. É a mesma coisa que acontece com os artistas de cinema ou de teatro que vemos no palco ou na tela (agora no computador ou no telefone) que sempre se adaptaram ao papel que representam e que de realidade não têm muita coisa.

Lembro-me de que jovem, estando no teatro universitário, representei a bruxinha que era boa da peça de Maria Clara Machado que tem esse nome. Na platéia havia um punhado de crianças emocionadas que mal podia distinguir a realidade da existência das bruxas e bruxos... Finalizada a atuação, o menor de meus primos sob ao palco furioso para bater no bruxo que tinha me prendido na torre! O bruxo, que era representado pelo J. Dângelo, importantíssima personalidade na política mineira hoje em dia, tirou a “maquiagem” e conversou e conversou com ele mostrando que era tudo um “fingimento”, que na vida real ele era meu amigo, incapaz de me prender! E meu priminho fez amizade com ele. Por outro lado, uma menina que veio ao lado da mãe me cumprimentar pela atuação, me olhou espantada dizendo: “Eu pensei que você era uma bruxinha pequena, mas você já é grande!” Eu nunca fui grande, mas claro que vista de longe, na altura do palco, ao lado do alto bruxo J. Dângelo, eu parecia uma bruxinha de brinquedo. E eu também expliquei à menina: “Eu estava só fingindo que era pequena!” Mas chegou um dia em que me cansei de estar sempre fazendo o papel de menininha no teatro. Protestei. Queria representar uma mulher adulta. Mas o diretor do teatro comentou: “Pois você ainda tem voz de Chapeuzinho Vermelho, então vai ter que empostar a voz para falar como gente grande”. E eu fiz isso, o que me foi muito beneficial quando comecei a dar aulas e a ser diretora de teatro aqui nos Estados Unidos. Mas isso quando estou atuando. A voz de Chapeuzinho Vermelho ficou comigo durante muito tempo na intimidade da família. O respeito que adquiri profissionalmente nunca foi reconhecido em casa. Nem pelo telefone. Alguma vez a voz do outro lado da linha me mandou chamar a minha mãe... A que eu respondia: “A mãe aqui sou eu mesma!”

Tantos conflitos temos entre a aparência e a realidade! É claro que nossos filhos vão acompanhando nosso envelhecimento e não lhes passa pela cabeça que já vamos pelos trinta, depois pelos quarenta e que algum dia ultrapassaremos a juventude dos 50 e tantos. Nem nós mesmos prestamos muita atenção nisso. Chegam os netos e um deles reclama: Você não parece avó! E eu pergunto: Por quê? Não sou boazinha, dou presentes e compro biscoitinhos e bolos? E ele responde indignado: “Você não tem cabelo branco!” E dou outra explicação: “Isto era antigamente, quando as vovós tinham cabelo branco! Agora elas podem pintar o cabelo da cor que quiserem. Como eu quando era menina tinha o cabelo branco e todo mundo me chamava de “velha” ou de “tostão de paina”, agora pinto o meu cabelo bem escuro, para que ninguém se atreva a me insultar mais!”

Por outro lado, os filhos mais novos, que se acostumaram com o nosso envelhecimento e não notaram que um dia vamos ficando mais débeis, enrugados e principalmente cansados, espantam-se ao saber que algum dia (faz muito tempo) éramos mais jovens que eles. Meu filho caçula, o que é mais agarrado comigo e o único que reconhece que já tenho uma obra literária feita e publicada e que segue os meus conselhos com confiança, disse outro dia quando encontrou uma fotografia minha vestida de noiva, do primeiro casamento: “Mamãe, você era uma menininha quando se casou!” E a única coisa que me ocorreu dizer foi: “É, naquele tempo era assim...”

Este episódio me ensinou uma coisa muito importante e é que os nossos leitores têm o mesmo direito que nossos filhos: de nos acompanharem na nossa maturidade. Não devemos manter nas publicações as mesmas fotografias de vinte anos passados. Ao contrário, devemos vencer a vaidade e atualizar nossa imagem para os leitores e deixar que eles se acostumem com esse crescimento mental que nos orgulhece tanto. Com cabelos brancos ou escuros, ser de idade não quer dizer que somos feios. Quem gostar do texto que lê, vai gostar da imagem (da foto) que vê. Isto deve nos trazer alguma tranqüilidade quando nos encontrarmos cara a cara com os tais leitores.
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*Teresinka Pereira, poeta, conferencista, presidente da Associação Internacional de Escritores e Artistas  - Estados Unidos

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