quinta-feira, 8 de abril de 2010

POR QUE DOBRAM OS SINOS DE SEOUL?

OS SINOS DE SEUL
Hélio Moreira* Vista de Seul - Coreia

Um dos grandes problemas que enfrentamos, meu filho Hélio Junior e eu, nesta viagem para a Ásia, especificamente para a Coréia, foi a questão do fuso horário; durante os três primeiros dias praticamente não dormimos, pois, nossas atividades (congresso médico) obrigavam-nos a permanecer acordados durante o dia e quando chegava a noite, não havia maneira de conciliar o sono. Conversávamos a noite inteira!

Durante esta nossa vigília ouvíamos, a partir das quatro horas da madrugada, um maravilhoso badalar de sinos que deixava-nos extasiados pela paz de espírito que nos transmitia; contávamos o intervalo entre as bimbalhadas (quinze segundos), o numero de vezes que repicavam (seis vezes), depois aguardávamos chegar a hora do próximo espetáculo (as cinco, seis e sete horas da manhã).
Sem nenhuma dificuldade percebemos que, em frente ao nosso hotel, havia um templo budista de onde vinha o majestoso som; programamos visitá-lo em algum momento de folga da nossa programação.
Era uma terça feira, mais ou menos quatro horas da tarde, da janela do nosso hotel assistíamos um espetáculo inusitado para nós brasileiros: caia uma neve, como se fossem flocos de algodão que despencavam do céu, à medida que o tempo ia passando, foi embranquecendo o verde do jardim e transformando os arranjos florais em amontoados de gelo, como se fossem nossos cupinzeiros pintados de branco; as folhas dos galhos das árvores foram substituídas por uma miríade de pequenas bolas brancas, imitando as lâmpadas que enfeitam as árvores de natal.


De vez em quando caía uma destas bolas, esborrachando-se na calçada, mas logo em seguida, sem dar tempo para a folha verde mostrar sua onipresença, novos flocos de algodão voltavam a embranquecer as que teimavam em lutar contra a força da natureza.
Ainda sob os influxos deste espetáculo maravilhoso resolvemos visitar o Templo, cuja imponência arquitetônica se destacava no nosso horizonte de visão.

Antes de adentrarmos, procuramos algum subsidio no “bureau” de informações, localizado bem na sua entrada; ficamos sabendo, então, que na verdade se tratava de vários templos (mais de quinze), cujo conjunto leva o nome de Bongeunsa, e o inicio da sua construção remonta a mais de mil anos.

Uma das primeiras coisas que fizemos foi procurar o local onde se achava o misterioso sino; de acordo com o nosso mapa, o Jongroo (pavilhão do sino) estava a poucos passos da entrada.
É impossível ficar impassível diante do colossal tamanho do Bupgo (sino) e, segundo ficamos sabendo, o som profundo que emana das suas badaladas e a harmonia conseguida pela mistura de metal (bronze) e a madeira que o sustenta representam, simbolicamente, o som da cultura Coreana que, solenemente, pode ser ouvido, todos os dias, antes do amanhecer.

Interior de um templo de Buda, em Seul

A surpresa mais encantadora estava reservada para nossa visita ao templo Daewoongjeon que é o mais importante de todo o conjunto, pois é o centro de todas as atividades religiosas; as escadarias que dão acesso à sua entrada é toda enfeitada com imagens de dragões escavados na madeira; todas as paredes, janelas e portas são decoradas com flores esculpidas na madeira, significando a beleza e o amor à natureza, tradicional no estilo da arquitetura coreana.

O nome do templo significa o “Grande herói” que é outro nome designativo de Buda, cuja estátua está localizada bem no centro do altar; a entrada ao seu interior é precedida pela retirada dos sapatos e, logo em seguida, são oferecidas almofadas para se ajoelhar ou, eventualmente, sentar-se.

Não há como não ser envolvido pelo clima de tranqüilidade que emana daquele ambiente, não há como não se ajoelhar, fechar os olhos e fazer uma prece para reverenciar a figura majestosa de Buda.

O silêncio é profundo, semelhante ao que ocorre no interior dos grandes templos, de todas as religiões; nestes momentos nosso envolvimento com a fé transcende o local onde estamos e leva-nos a outras paragens e concluo, para minha satisfação pessoal, que também na Catedral de São Pedro, em Roma, no enorme templo Budista de Bangkok na Tailândia, na Basílica de Santa Sofia em Istambul na Turquia, senti aquele mesmo remanso de paz e intima alegria.

Eu creio, disse certa feita Alceu de Amoroso Lima para a freira Maria Teresa, sua filha, isto me basta!

Na ultima sessão cientifica da tarde de ontem, ouvimos de um cientista inglês, envolvido em estudos de física nuclear, uma declaração que assusta: “A ciência está livre do principal vicio da religião, que é a fé”.

Quando, não este, mas um outro cientista nos afirma que “uma mesma partícula nuclear pode passar por dois orifícios diferentes ao mesmo tempo” sugere-nos a necessidade de termos algo parecido com a fé para aceitarmos, como razoável, esta proposição.

As pessoas podem pensar de maneira diferente, mas a verdade será igual para todas elas; a verdade é única em qualquer religião. Os ensinamentos de todas as religiões deverão nos levar, sempre, a trilhar o caminho da humildade.

Quando nos colocamos em sintonia com a verdade, argumentos acerca de religião serão triviais como as partículas de pó que o vento carrega.


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*Hélio Moreira, médico e escritor, membro da Academia Goiana de Letras, da
Academia Goiana de Medicina e do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás.
Para comunicação: e-mail: drhmoreira@gmail.com
www.heliomoreirablogspot.com

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