quinta-feira, 13 de março de 2008

A TRAGÉDIA NO ENSINO DE LITERATURA

Joelson John Gomes da Silva*

“A arte imita a vida”. Essa concepção aristotélica parece bem aplicada quando o assunto é o ensino de literatura; este, como o herói trágico, não consegue fugir do seu triste destino. Assim tem sido a realidade da literatura no ensino médio, com a devida ressalva de que não são os deuses do Olimpo a comandar o destino do homem, mas sim as artimanhas do capital para assegurar a hegemonia dos que ditam as regras do poder.

Da mesma forma que um elefante incomoda muita gente, podemos dizer que um leitor crítico incomoda muita gente. Tomando o pressuposto por verdadeiro, torna-se mais evidente porque alguns esforços fracassam ao tentar reverter esse quadro, por mais que haja boas intenções. Para constatar a veracidade dos fatos basta examinar as verbas que chegam às escolas, limitadas verbas que não suprem um quadro funcional e estrutural fecundo ao estudo. Quando pensamos precisamente no ensino médio, a situação fica mais crítica, visto que por natureza ele se encontra em posição desfavorável por estar localizado entre o ensino fundamental e o universitário; com duração de 3 anos (sem mencionar a densidade de seu conteúdo), finda sendo muita responsabilidade para curto espaço de tempo.

No caso particular da literatura, incorporada na grade curricular da disciplina de língua portuguesa, acaba geralmente servindo de suporte para análises sintáticas e morfológicas; quando muito, um estudo fragmentado de trechos de obras e poemas isolados, como exemplos de estilos correspondentes a determinadas escolas literárias (prática reforçada pelos livros didáticos). É mais que notório que o livro didático seja a bússola direcionadora quando dispomos de professores com formação deficiente frente a salas de aula. O professor às vezes se pergunta como fazer os alunos adquirirem uma prática de leitura quando ele mesmo não a tem.

O local por excelência para a leitura literária é a escola. É dentro dela que o aluno pode e deve tornar-se um leitor crítico, pois fora de seus domínios o que predomina é a escolha anárquica de textos de consumo fácil, repletos de clichês, estereótipos, sem conteúdo relevante. Ao chegar ao ensino médio, o aluno deveria vir dotado de uma prática de leitura advinda do ensino fundamental e preparado para leitura de obras mais complexas pertencentes ao cânone literário. O que ocorre é o contrário, geralmente o primeiro contato – digo um contato de relevância – com o texto literário é feito tardamente, gerando assim rejeição de obras fundamentais para seu aprimoramento intelectual e cultural, cobrado nos exames de vestibular.

O texto literário deve proporcionar prazer estético ao leitor, além de discutir questões inerentes ao ser humano. Quando o texto consegue esse feito é considerado como uma obra de arte. Fazer com que o aluno compreenda isso é o dever do professor de literatura. Devido ao caos na educação, a concretude desse objetivo tem se mantido distante. Há muito tempo esse problema tornou-se um círculo vicioso: professores advindos dos cursos de letras com formação deficiente, que irão atuar no ensino fundamental e médio, proporcionando aos alunos desde o início uma apatia intelectual com o texto literário que se transforma em rejeição quando partem para o ensino médio; quando essas pessoas sofridamente ultrapassam o vestibular, uma boa parte deságua nos cursos de letras com a esperança de conseguir um título acadêmico de fácil aquisição – o pior é que elas conseguem. Esse carrossel do circo dos horrores garante uma população de verdadeiros zumbis, trivial a uma sociedade desigual, discriminativa, injusta, violenta e miserável. É assim que as políticas neoliberais mantêm a ordem pública.

A necessidade da revolução proclamada por Karl Marx como único meio possível para mudar a realidade mostra-se cada dia mais patente; do contrário, a palavra democracia será apenas uma pedra oca no meio do caminho. Salvo o empenho de grupos bem intencionados, mas precisaremos mais que alguns beija-flores para apagar o incêndio na floresta.

(Artigo publicado no “Diário de Cuiabá”, em 10.03.2008

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*Joelson John Gomes da Silva é professor de Língua Portuguesa, Espanhol e Literatura

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